7º FESTIVAL DO FIME DOCUMENTÁRIO ETNOGRÁFICO DE BELO HORIZONTE - 7º FORUMDOC.BH.2003


7º Forumdoc.bh.2003

É num momento ímpar que o Cinusp Paulo Emílio apresenta o 7º Festival do Filme Documentário e Etnográfico de Belo Horizonte. O ano de 2002 foi auspicioso para o documentário - sorte que, com menor ênfase, se repetiu em 2003. Michael Moore e Nicolas Philibert levaram milhares de espectadores às salas de cinema com seus Tiros em Columbine e Ser e Ter, respectivamente. Para não sermos levados a crer que é um fenômeno totalmente isolado, no Brasil houve as bem sucedidas carreiras de Ônibus 174 de José Padilha, Edifício Master de Eduardo Coutinho e Nelson Freire de João Moreira Salles.
O que teria levado o público, normalmente avesso ao formato, a retirar o filme documental das acanhadas salas comercias e do sisudo circuito cultural em que costumava se abrigar exatamente quando a ficção suprarreal pareceu dar seus mais vigorosos passos com Matrix e O Senhor dos Anéis (e seus derivados 1,2,3...)?
Por um lado, creio ter havido uma certa ficcionalização do documentário que passou a flertar, com menos pudor, com gêneros dramáticos do cinema, como o suspense e o melodrama - haja vista a música e trilha sonora usada em Ônibus 174 ou a expectativa gerada pela busca da mãe biológica em 33 de Kiko Goifmann. Além disso, a televisão - notadamente a por assinatura - tem oferecido variado (e duvidoso) repertório documental em sua grade, utilizando-se do prestígio que o formato goza para credibilizar sua programação com filmes e programas jornalísticos, muita vez, de qualidade duvidosa.
Por outro lado, há uma certa falência do modelo tradicional da ficção, ora edulcorada com recursos digitais. E possível que a ficção virtual tenha feito migrar as exigências usualmente feitas à narrativa convencional. Tradicionalmente os critérios de verossimilhança assentam-se na obra, na confecção interna da estrutura que forja um pacto com o espectador que permite aceitar como verdadeiro e “real” aquilo que é produzido ficcionalmente, porém justificado dentro da estrutura interna e dramatúrgica da obra - o Superman voa!
Entretanto, com o advento de novas tecnologias que permitiram a substituição de espaços, objetos e até atores por criações computadorizadas este pacto sofreu um abalo. E possível que resida no campo estético uma parcela da verossimilhança. Embora dentro da narrativa e estrutura propostas os novos episódios de Guerra nas Estrelas & cia. sejam verossímeis, a adesão à história é mais hesitante - é bom que se diga que os roteiros em si também não colaboram muito - como se o público aceitasse o pacto, mas não o referendasse. Assim, embora muitos desses filmes tenham sido êxitos incontestes de bilheteria, tiveram dificuldades, para além do gigantesco esquema de marketing, de permanecer com os espectadores quando deixam as salas escuras dos cinemas.
E emblemático notar que a personagem mais bem sucedida desses filmes tenha sido o monstrengo Smeagle, de O Senhor dos Anéis. Não por sua elaboração técnica, mas pela ambigüidade, fragilidade e temores que o humanizam e cujas deteriorações físicas impediriam um ator de representá-lo.
Por isso, é possível que o público tenha se voltado um pouco mais para o cinema documental na busca , de ver representado o que lhe possa parecer, por paradoxal que seja, mais real e ficcionalmente elaborado.
Em sua sétima edição o forumdoc.bh.2003 - festival vai do filme documentário e etnográfico de belo horizonte se consolida com um espaço único de exibição e discussão do documentário contemporâneo. Fora do eixo Rio-São Paulo - e talvez por isso mesmo - apresenta o que , há de mais importante na cena documental brasileira e mundial no momento, com mesas de debates que tentam acompanhar toda tendência percebida no formato. No momento em que o há o boom do documentário, o Cinusp "Paulo Emílio" reafirma sua parceria com este imprescindível festival e apresenta a mostra competitiva nacional. Longe de esgotar o tema, serve de instrumental a uma reflexão mais aprofundada.

Júlio Maria Pessoa.