MARGUERITE DURAS


A obra literária de Marguerite Duras pode ser dividida em 5 fases ou maneiras: a “realista”, a do “novo romance”, a “romanesca”, a “escritural”, e a “transparente”. A primeira fase, tributária do romance norte-americano, é predominantemente narrativa. Em "Uma Barragem Contra o Pacífico" (1950), "O Marinheiro de Gibraltar" (1952) e "Os Cavalinhos de Tarquínia" (1953) encontramos uma narradora hábil, capaz de criar tramas interessantes e personagens verossímeis, representativas de certo malestar social e psicológico da primeira metade de nosso século.
Os livros da segunda fase têm afinidades com o então triunfante “nouveau roman”, mais pela temática da ausência, da solidão e da errança do que pelo experimentalismo técnico, que não atraia a autora. Desta safra podemos citar "Le Square" (1955), "Moderato Cantabile" (1958) e "A Tarde do Senhor Andesmas" (1962).
A terceira fase corresponde ao encontro de um estilo próprio e de um universo romanesco inconfundível. A essa fase pertencem "O Êxtase de Lol V. Stein" (1962) e "O Vice-Cônsul" (1965), obras cujas intrigas e personagens se entrelaçam, e acabam por desembocar nos filmes Nathalie Granger (1972) , A Mulher do Ganges (1973) e Índia Song (1975). O realismo das primeiras ficções cede então lugar a fantasias tecidas sobre situações raras, vividas por personagens extravagantes e romanescas. Por seu caráter fantasmático, esse setor da obra de Duras constituirá uma espécie de tesouro, a que ela recorrerá obsessivamente. Trata-se de um território à parte, que a crítica chamou de “Durásia”.
Dai para diante, em seus livros como em seus filmes, Duras se concentrará, cada vez mais, em situações e diálogos minimalistas, incansavelmente retomados. Seus filmes explorarão a duração psicológica e a ausência de acontecimentos - Vera Baxter (1976), O Caminhão (1977), o mesmo ocorrendo em seus livros - "Navire Night" (1979), "Outside" (1981), "A Doença da Morte" (1982).
Quando todos pensavam que Marguerite não mudaria mais, e continuaria sendo, para sempre, aquela autora difícil, sublime e irritante, ela surpreendeu a todos publicando "O Amante" (1984), narrativa autobiográfica de leitura amena e, ao mesmo tempo, um texto de grande qualidade estética. No ano seguinte Duras publicou "A Dor" (1985), relato igualmente autobiográfico em que ela relembra os anos da ocupação nazista. Segundo testemunho da autora, foi um livro que ela escreveu chorando. Nessas duas obras, o estilo de Duras apresenta-se transparente e “fácil”, por outras palavras, clássico. O Amante tornou-se logo um bestseller, foi traduzido em dezenas de línguas e ganhou vários prêmios, entre eles o Goncourt, a maior recompensa literária francesa. Foi transformado em filme que a autora renegou.

Leyla Perrone-Moisés, trecho de um artigo publicado pela Folha de São Paulo em 04/03/1996.