CINEMA HOMOERÓTICO


Algo muito desinteressante está acontecendo quando vamos ao cinema e não mais conseguimos estranhar a realidade que nos cerca. Os filmes parecem um prolongamento natural de nosso cotidiano imutável - quando muito, meros anestesiantes para o suportarmos.
Frequentemente, a imagem fílmica reproduz a fragmentação, efemeridade e saturação às quais estamos submetidos neste apocalíptico final de século. Qualquer tentativa de resgate da integridade do homem contemporâneo parece se frustrar em podres discursos ideológicos sem muito efeito. É dessa consciência da impotência do discurso verbal que se faz a reflexão da metalinguagem. Podemos, então, ver filmes de estranhas qualidades estéticas: a montagem lenta dos planos, o tratamento sígnico dado à cor, imagens de intensa fruição poética, etc.
Há ainda aqueles que recorrem insistentemente a personagem-chave: o retorno do filho pródigo, a criança inocente que a tudo observa, o estrangeiro, anjos, androides, ou toda uma legião de excluídos que, na vivência do estigma ou de uma condição existencial especial, ganha uma importância que antes era dedicada exclusivamente às massas oprimidas pelos modos de produção econômica.
É assim que o personagem com inclinações homoeróticas permeia (senão concentra) grande parte dos filmes atuais, quase sempre funcionando como contraponto à institucionalidade ou a burocracia dos relacionamentos interpessoais. Mesmo em aparições secundárias, este personagem interfere na narrativa dos protagonistas. Fá-los repensar a afetividade, a paixão, a coragem de ousar.
Durante muito tempo, o cinema excluiu todos os fenômenos que não inserissem dentro de usa lógica racional-iluminista. Independente das explicações que possam vir, ou não, os fenômenos existem e surgem com a força de sua subversão na tela. Daí, um famoso cineasta gay dizer que filma "por solidariedade com pessoas que foram privadas de uma cultura e de uma imagem com as quais se identificar" - a representação, por tanto tempo, ignorada pela indústria cultural.
É essa sensibilidade diante da opressão que o CAEHUSP (Centro Acadêmico de estudos Homoeróticos da USP) junto ao CINUSP "Paulo Emílio" vêm expor à apreciação, reflexão e debate com alguns filmes de temática homoerótica. Este tem sido o caráter essencial do CAEHUSP em sua trajetória de ousadia, inedetismo e seriedade. O CAEHUSP já realizou o importante projeto "Adolescência sem Riscos" este ano, quando foi instalada no campus a Kamizona, realizaram-se palestras sobre poesia, literatura, homossexualidade e AIDS, além de publicarmos a Revista CAEHUSP (manual do calouro). Mais que uma reflexão sobre a condição especial de gays e lésbicas, propomos um olhar renovado sobre a condição humana neste surpreendente fim de século. Todos têm muito a ganhar com essa produção cultural intensa e apaixonada que saiu dos armários hollywoodianos para falar do AMOR ACIMA DE TUDO em grandes platéias e grandes bilheterias de todo o mundo.

Centro de Estudos Homoeróticos da Universidade de São Paulo.