CINEMA JAPONÊS
Em 1955, quando o Ocidente começava a conhecer as produções cinematográficas japonesas através de festivais como o de Cannes e o de Veneza, André Bazin, um dos principais críticos franceses, escrevia o texto "A Lição de Estilo do Cinema Japonês", publicado no Brasil na coletânea "O Cinema da Crueldade" (Martins Fontes, 1989). Transcrevemos abaixo trechos do texto de Bazin, para nós a melhor apresentação possível à mostra "Cinema Japonês":
"Não existe provavelmente, com efeito, nenhuma produção no mundo que nos dê a impressão de ser mais perfeitamente homogênea, de traduzir o gênio artístico de uma civilização (do que a japonesa). Já assisti a cerca de vinte e cinco filmes japoneses, variados em seu gênero e muito desiguais em sua realização. (...) Mas o que ainda não vi, mesmo quando o espetáculo era enfadonho, ingênuo ou, aos meus olhos de ocidental, sem interesse, é um filme japonês vulgar ou meramente de mau gosto. Por certo, a razão da evolução da nossa arte ocidental, do seu divórcio com o povo, da sua individualização exacerbada, é o desaparecimento progressivo, a partir do século XVIII, de qualquer qualidade anônima. O estilo é o homem, e não mais uma civilização. Temos grandes pintores, grandes escritores e até grandes cineastas. Porém, não temos, na realidade, uma grande literatura e muito menos um grande cinema. Quero dizer, não há um estilo comum, um mínimo de retórica que o mais medíocre dos artistas seja capaz de usar sem muita imperícia. (...)
Provavelmente só Hollywood nos oferece hoje, até certo ponto, o exemplo de um cinema válido não apenas em suas obras particulares como também na retórica de sua produção 'comercial'. Ali, também, o cinema é homogêneo à civilização que ele satisfaz e exprime. Na Europa, porém, já não existe o cinema; somente filmes, bons e ruins, como os livros ou os quadros. (...)
Ora, parece que o caso do cinema japonês difere a um tempo do de Hollywood e do nosso. País de cultura antiga e de fortes tradições, o Japão parece ter assimilado o cinema com tanta facilidade quanto todas as técnicas ocidentais. Mas assim como estas, longe de destruir-lhe a cultura, foram imediatamente integradas a ela, e o cinema situou-se de pronto e sem conflito ao nível da arte japonesa em geral. (...)
No Japão, sem dúvida, a exceção só poderia ser o inverso, e dificilmente haveria um realizador bárbaro e inculto o suficiente para não compor espontaneamente sua imagem segundo as melhores tradições plásticas da arte oriental, do mesmo modo que não existe um japonês capaz de entornar o chá sobre a toalha ou, em todo o arquipélago, uma cerejeira mal podada. E o que eu digo das cerejeiras e da encenação se aplica, é fácil percebê- lo, aos sentimentos e à sua expressão dramática. Quanto a mim, vejo a verdadeira revelação do cinema japonês nessa estupefaciente e única lição de estilo, não já do artista criador, senão de toda uma civilização em que o último dos homens não saberia infringir sequer o ritual da dor."