BOLLYWOOD FICA NA ÍNDIA


A Índia é o país que mais produz filmes no mundo e, apesar disso, a sua cinematografia continua sendo um enigma para cinéfilos, profissionais e críticos de cinema ocidentais. Produz muito mais do que Holywood e provavelmente do que o resto do mundo juntos (com exceção da China, talvez). Em um só filme, que facilmente alcança três horas de duração, muitas vezes se encontra um desfile de gêneros com direito a ação, romance, comédia, danças e musicais num universo assumidamente lúdico e fantástico, grandioso e colorido.
Chamada de Bollywood, pela similaridade com a gigante indústria cinematográfica americana e por se localizar principalmente na cidade de Bombaim, a história do cinema indiano se inicia em 1913, mas só começou a ganhar o ocidente em 1955, com o filme Pather Panchali, primeiro filme de Satyajit Ray, nome indiano mais conhecido no ocidente, junto com Rhitwak Ghatak. Mas as últimas aproximações do público ocidental com o cinema indiano devem-se às recentes produções da indo-americana Mira Nair, fortemente influenciada pelo cinema Hollywoodiano, sendo a primeira diretora a ganhar o Leão de Ouro no Festival de Veneza com o filme Casamento à Indiana.
Entretanto, o cinema mais popular da Índia ainda é desconhecido e não se aproxima desses nomes que ultrapassaram a fronteira do oriente. Este cinema está a cargo de outros cineastas, monstros poderosos da industria indiana que já produziram grandes sucessos como Raj Kapoor e M.S. Sathyu. Kapoor, filho de um veterano ator indiano, Prithviraj Kapoor, talvez seja o nome mais significativo desta modesta retrospectiva, com destaque para Awara, seu terceiro filme em que também atua. Para o seu primeiro filme, Aag (1948), Kapoor se tornou produtor, diretor e ator e na época já era um renomado artista.
Lançado em 1951, Awara acrescenta recorrente tratamento chapliniano aos seus personagens encarnando em Raj, o vagabundo que protagonizaria tgmbém em outros filmes que dirigiu e interpretou. Particularmente famoso por uma absurda e maravilhosa sequência de sonhos, Awara foi o primeiro grande sucesso de Kapoor. O diretor de arte M.R. Achrekar transformou quase todo o estúdio (RK Studio) em um gigantesco set para a filmagem desta sequência que demorou mais de três meses para ficar pronta e resultou em nove minutos das quase três horas totais do filme.
Ainda na mostra, temos outros importantes filmes de Kapoor como Shree 420, uma das comédias mais famosas do cinema indiano; e um de seus filmes mais recentes, Bobby, interpretado por seu filho Rishi. E ainda poderão ser conferidos este e outros grandes filmes e cineastas que atestam o desenvolvimento desde os anos 50 da maior indústria cinematográficica

A Índia é a maior produtora de cinema do mundo, fazendo mais de 800 filmes por ano em 16 línguas diferentes, alcançando um público médio de 2,8 bilhões de espectadores. Hollywood ostenta a sua fama de poderosa com pouco menos de 500 filmes por ano e um público de 1,6 bilhões de espectadores. Dos 800 filmes produzidos na Índia, 300 (150 em Hindi) são produzidos somente em Mumbai (antiga Bombaim) com seus labirintos de bairros comerciais, cheios de pessoas, trânsito complicado e ruas repletas de animais soltos como vacas, bodes, macacos e até elefantes.
Destes 300 filmes, apenas 15 são realmente megaproduções, com grandes estrelas e diretores, e um orçamento de 150 milhões de rúpias indianas (mais ou menos 3 milhões de dólares) ou mais. Os filmes de arte geralmente fazem parte da classe “C” de produções indianas, com orçamento de até 20 milhões de rupias.
O cinema indiano, sem pressa e necessidade de se afirmar fora de seu país vai conquistando e influenciando uma incipiente, porém considerável geração de artistas ocidentais e de outras partes do mundo aonde a cinematografia indiana se faz presente e é reconhecida.
Baz Luhimann antes de filmar Moulin Rouge viajou para a Índia de onde trouxe uma assumida referência bollywoodiana para o kitsch de seu musical com Nicole Kidman e Ewan McGregor. Influência que ele mesmo assume como uma quase descoberta de um cinema que pela sua despretensão se esconde do resto do mundo e que merecidamente terá o seu reconhecimento.
O contraste cultural, a deliciosa extravagância quase inconsciente de suas produções, a sua auto-suficiência, a quase mítica existência deste mercado tão poderoso, que consegue ser grande dentro de seus limites tão menores que o seu similar americano, é algo que merece o seu justificado reconhecimento, e é a oportunidade que esta mostra que o Consulado Indiano em São Paulo, em parceria com Centro Cultural São Paulo, o CINUSP e a Cinemateca do MAM-Rio, estão dando para o seu público do dia 1° de março até o dia 31.

Célio Franeeschet.