100 ANOS DE CINEMA INDIANO
Em abril de 1913, o filme Raja Harischandra, baseado na mitologia hindu e dirigido por Dadasaheb Phalke,considerado o primeiro longa-metragem de ficção do cinema indiano, fez sua estreia para o grande público em Bombaim. De lá para cá, a indústria cinematográfica indiana cresceu e prosperou: movimenta hoje cerca de US$ 3 bilhões e produz mais de mil filmes por ano, quase o dobro de Hollywood. Seus atores são vistos como verdadeiros deuses pelo povo e alguns deles têm templos construídos em sua homenagem. Todos os dias, cerca de 14 milhões de pessoas vão ao cinema na Índia, o que faz dessa forma de entretenimento a maior diversão do povo indiano, mais até do que a televisão: uma paixão comparável somente àquela despertada pelo críquete, o esporte nacional.
Para comemorar o centenário daquele importante marco da cinematografia mundial, o CINUSP Paulo Emílio, em parceria com o Departamento de Letras Modernas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e com o apoio do Centro Cultural Indiano, apresenta a mostra 100 ANOS DE CINEMA INDIANO, que oferece uma seleção panorâmica de filmes representativos dessa cinematografia, uma das mais prolíficas, populares e diversificadas do mundo. Além de assistir aos filmes reunidos na mostra, o público interessado pode ainda participar do curso de extensão 100 Anos de Cinema Indiano, coordenado pela professora Laura Izarra (Literatura Inglesa DLM/FFLCH-USP) e ministrado pelos professores Shobhan Saxena, jornalista indiano, e Florência Mendes Ferreira Costa, jornalista brasileira e ex-correspondente do jornal O Globo na Índia. As aulas do curso acontecem durante o período de 12 de setembro a 14 de novembro, sempre às quintas-feiras, das 14h às 17h, no prédio do curso de Letras da FFLCH-USP. Nos dias 19 e 26 de setembro, excepcionalmente, as aulas do curso são ministradas no CINUSP Paulo Emílio, como preparação para as sessões da mostra apresentadas em seguida. Mais informações sobre o curso podem ser obtidas no site: http://sce.fflch.usp.br/node/1403.
Complementando o conteúdo do curso e fornecendo material para um melhor aproveitamento de suas aulas, a mostra 100 ANOS DE CINEMA INDIANO reúne filmes de três períodos distintos as décadas de 1950, 1990 e 2000 , possibilitando uma percepção mais abrangente dessa cinematografia, que vai muito além da tradicional imagem sedimentada de Bollywood. Ao contrário do que se pode pensar, Bollywood é apenas uma parte da indústria cinematográfica indiana. Dos mil filmes anuais produzidos naquele país, apenas cerca de 200 são efetivamente de Bollywood termo cunhado pela junção dos nomes Bombaim, cidade onde está sediada a indústria de filmes falados em híndi, língua de 40% da população e presente especialmente no Norte do país, e Hollywood, pelo fato de boa parte dessas narrativas se inspirar no cinema clássico norte-americano. Por implicar nessa imagem americanizada do cinema indiano, muitos cineastas contemporâneos que produzem naquele país recusam esse termo, que simboliza os típicos musicais açucarados, recheados de dramas e de longa duração. Alguns jovens diretores de filmes em híndi encurtaram o tamanho de suas obras e eliminaram delas os números de música e dança, modernizando-as e as tornando mais ousadas. São os cineastas do que a mídia tem chamado de Nova Bollywood. Os filmes dessa nova safra, representada nesta mostra por títulos como Peepli ao Vivo,Amor, Sexo e Traição e Gangues de Wasseypur, rejeitam o escapismo, valem-se de roteiros mais inteligentes e realistas, são estrelados por atores escolhidos não necessariamente por sua beleza, mas por sua competência, e são mais ousados em termos de linguagem. Essas mudanças respondem às transformações da Nova Índia, em que o surgimento de uma emergente classe média urbana passou a demandar filmes que atendessem aos gostos dessas plateias diferenciadas.
Mas a mostra 100 ANOS DE CINEMA INDIANO não se furta a apresentar os antecedentes históricos dessa Nova Bollywood, reunindo também alguns dos maiores clássicos da cinematografia do país, como A Canção da Estrada, obra-prima de Satyajit Ray, o maior cineasta da Índia de todos os tempos, e os grandes sucessos O Vagabundo e Mãe Índia que, já nos anos 1950, percorreram o mundo arrecadando prêmios e prestígio e permitindo ao público internacional conhecer um cinema indiano que ia muito além dos longuíssimos musicais melodramáticos típicos da produção de Bollywood.
Nesse sentido, além de pertencerem a períodos distintos, os filmes selecionados para a mostra procuramcompreender essas nuances da produção indiana, não se resumindo apenas à produção bollywoodiana. Além disso, a mostra visa introduzir alguns elementos da história e da cultura indianas, selecionando filmes que abordam de forma lateral ou direta questões fundamentais da história do país. A luta pela independência, a sangrenta Partição que gerou o nascimento do Paquistão, as crises políticas e econômicas, os conflitos religiosos e sociais, a divisão em castas, a ascensão da Índia como potência global e o contraste da vida rural com o progresso urbano são alguns dos temas que permeiam a seleção dos filmes do evento, presentes em obras de nítidos contornos políticos e crítica social, como Train to Pakistan, A Cidade dos Sonhos, A Festa e Rainha Bandida. Assim, a mostra ilustra de que maneira o cinema tem sido o meio preferencial para narrar aos indianos a sua própria história e sua milenar mitologia, que alimentou os roteiros dos filmes do cinema nacional por muitos. O cinema indiano também é usado no campo diplomático como um dos mais poderosos instrumentos do chamadosoft power do país em relação ao resto do mundo, constituindo-se em um produto de exportação de imenso sucesso. Uma cinematografia rica e exuberante cujas múltiplas facetas se tornam agora acessíveis ao público do CINUSP Paulo Emílio por meio desta mostra imperdível.
Boas sessões!