2016: RIR PARA NÃO CHORAR


Entre os dias 28 de novembro e 18 de dezembro o CINUSP apresenta a mostra 2016: Rir para não chorar que privilegia o gênero comédia. 2016 não foi um ano fácil. A própria programação do CINUSP refletiu, em certa medida, a dureza deste ano, com muitas mostras de conteúdo denso e provocador. Para dar um respiro para o nosso público, apresentamos, como última mostra do ano, 2016: Rir Pra Não Chorar, trazendo uma seleção de comédias que marcaram a história do cinema. Reunimos diretores consagrados, sejam eles reconhecidos especialmente por sua produção cômica, como Charles Chaplin, John Waters e Mario Monicelli, sejam diretores mais conhecidos por outros gêneros, como Ingmar Bergman e Stanley Kubrick, e ainda outros com uma produção equilibrada como Tim Burton, Pedro Almodóvar, Emir Kusturica e Terry Gilliam. Além desses nomes, chamamos atenção para atrizes e atores que estrelam alguns dos filmes como Marilyn Monroe, Leslie Nielsen, Ricardo Darín, Selton Mello e Matheus Nachtergaele.

A comédia sempre foi um dos gêneros mais populares na história do cinema, com um poder imenso de cativar plateias e mobilizá -las em torno da catarse provocada pelo riso. A máxima “rindo criticam-se costumes” é pertinente a esta seleção, mas não se esgota aí o valor do riso. É também rindo que, muitas vezes, forjamos a força necessária para seguir em frente, encarando com bom-humor os sucessivos percalços da vida. A presente curadoria dá destaque a filmes que seguem a lógica do humor emergente de uma realidade muitas vezes lamentável, para reconsiderá-la ou mesmo debochar dela.

A comédia já despontava como um dos gêneros preferidos do público no período do cinema silencioso. Na ausência de falas, os diretores apostam na expressividade pura do corpo e do espaço, criando a chamada comédia física. Alguns anos após o advento do cinema sonoro, Chaplin realiza seu primeiro filme inteiramente falado, O Grande Ditador (1940), que faz uma sátira muito contundente à Segunda Guerra Mundial. A ousadia política renderia a Chaplin a expulsão dos EUA nos anos 50; paradoxalmente, ele recebeu várias indicações ao Oscar na carreira, num complexo caso de rejeição e consagração de sua obra.

O cinema clássico hollywoodiano traz grandes ícones, entre eles Marilyn Monroe no filme Quanto mais quente melhor, indicado ao Oscar de Melhor Filme em 1960, e dirigido por Billy Wilder, que considera esta a sua obra prima. Na Nova Hollywood (anos 60-70), jovens cineastas fizeram crítica à situação política do país, como em Dr. Fantástico, que aborda, em plena Guerra Fria, um general americano que resolve bombardear a União

Soviética para exterminar os comunistas. De 1980 será exibido Apertem os cintos... o piloto sumiu, uma paródia dos filmes de desastre, muito popular no filão “Sessão da Tarde”.

O cinema independente americano também lega algumas pérolas, como Hairspray, que faz em 1988 uma crítica à televisão americana racista e segregadora dos anos 60, numa reconstrução histórica bastante divertida. Do mesmo ano, a comédia dark Os fantasmas se divertem, mesclando em si vários gêneros para além da comédia, como o horror, a ficção científica e a fantasia. Cria uma atmosfera única, onírica e perturbada, que permite até mesmo que um personagem a priori assustador como Beetlejuice possa ser amado pelo público.

Para além do cinema americano, exibiremos o britânico O sentido da vida, do histórico grupo Monty Python. O filme é um percurso carregado de niilismo, ironia e humor em busca do que seria o sentido da vida. Há, ainda, comédias do cinema moderno europeu, como O olho do Diabo, de Bergman, que surpreende por vir de um diretor muito conhecido por dramas existenciais densos. A comédia italiana também tem uma tradição importante, aqui contemplada por O incrível exército de Brancaleone, paródia das novelas de cavalaria medievais que conta a história do cavaleiro Brancaleone, convidado para formar um exército com pobres aldeões.

Gato preto, gato branco recebeu o Leão de Prata (Melhor Diretor) no Festival de Veneza e narra com energia e entusiasmo as desventuras de três gerações de uma família cigana, sempre “à beira do colapso” (nas palavras do próprio diretor), mas que se mantém de pé e segue adiante desenfreadamente. Kusturica acredita no riso como arma num contexto político agitado, quando do desmembramento da Iugoslávia após a queda do

Muro de Berlim, envolvendo violentos conflitos étnicos. Mulheres à beira de um ataque de nervos traz muito do que está no cerne do cinema de Almodóvar: melodrama de tom novelístico, personagens femininas exaltadas e hilárias, abordagem pouco convencional de sexo e drogas, tramas nonsense envolvendo crimes, além de alguns atores recorrentes, como Carmen Maura, Antonio Banderas e Rossy de Palma.

Filme mais recente na curadoria, Vizinhos 2: O despertar da sororidade é destaque por se tratar de uma comédia americana adolescente que apresenta o feminismo como temática. Diferentemente da maioria dos besteiróis, o filme não estereotipa ou subjuga as personagens femininas para provocar riso, pelo contrário: o alvo das piadas é o sexismo. O enredo se foca num grupo de calouras unidas contra uma lei que não permite que repúblicas femininas façam festas; elas fundam uma nova república para lutar contra a desigualdade de gênero — com muita festa.

Na América Latina, o argentino Um conto chinês, vencedor do prêmio Goya de melhor filme hispano-americano, conta a história de um encontro absurdo entre o solitário e mal-humorado Roberto, e Jun, um chinês que acaba de chegar a Buenos Aires e não fala uma palavra em espanhol. A “comunicação” entre os dois garante boas risadas.

A comédia é um gênero que sempre esteve presente na história do cinema brasileiro. Tidas como “popularescas” ou “vulgares”, são responsáveis pelas nossas maiores bilheterias. Como representantes brasileiros na mostra, a chanchada O batedor de carteiras, marca de um dos momentos mais populares do cinema brasileiro em seu contato com o público, e contém raro número musical de “Meu Mundo Caiu” interpretado por Maysa Matarazzo. Trazemos também um sucesso da retomada, O Auto da Compadecida, inspirado na obra de Ariano Suassuna, que traz João Grilo e Chicó centrados numa rede de acontecimentos em uma cidade pequena no sertão nordestino, onde as hipocrisias e os afetos se desdobram e se sobrepõe em relações complexas.

Desejamos que todos se divirtam, se aproveitando do cinema como ferramenta de envolvimento mas também descarga emocional, para suportarmos com um pouco mais de alegriatanto os tempos bons como os difíceis. Boas sessões!