+ OBSCENA: SEXO NO CINEMA


A sexualidade permeia diversos elementos do dia a dia, desde a forma como as pessoas se vestem até as intenções eróticas implícitas em campanhas publicitárias. Ironicamente, a exposição do sexo continua sendo um tabu na sociedade. No cinema, o sexo encontra um veículo para se mostrar ao público, apesar das censuras. Desde suas primeiras aparições - inicialmente com circulação limitada a ambientes restritos - o sexo está cada vez mais presente nas telas. O CINUSP Paulo Emílio apresenta entre os dias 10 e 28 de abril a mostra + OBSCENA: SEXO NO CINEMA, com 15 longas-metragens e um curta que abordam o obsceno sob diversos aspectos.

Em sua primeira edição, com o nome OBSCENA: SEXO NO CINEMA, a mostra procurou selecionar filmes que escancaram o sexo sem pudor, com foco no explícito. A segunda edição buscou filmes que expõem o sexo de forma não erotizada, explorando a ideia do obsceno em diferentes perspectivas.

Ao tratar da sexualidade, os conceitos de erótico e pornográfico, embora distintos, aparecem separados por uma linha tênue. O termo “erótico” deriva de Eros, deus do amor. Já “pornográfico” tem sua origem no grego pornographos, que significa “escritos sobre prostitutas”. Enquanto o erótico abre margem para o sentimento amoroso, o pornográfico vai diretamente no sentido da libido.

O erotismo e a pornografia estão relacionados com o obsceno ao mostrar aquilo que se esconde e transgredir os limites impostos pela moral, os quais são sempre reconfigurados conforme as transformações sociais e a passagem do tempo. O conceito de obsceno não está encerrado em si mesmo, mas depende de fatores culturais e do contexto em que está inserido dentro de uma obra. A censura acompanhou as reformulações do conceito de obsceno, intensificando-se em alguns períodos e abrandando-se em outros.

No cinema, a inserção do obsceno abre espaço para mostrar o sexo em variados ângulos e englobar outros temas. A mostra + OBSCENA inclui filmes que apresentam diferentes olhares sobre o sexo, passando por questões como pornografia, o sexo enquanto vício, relações de poder e diferenças de gênero.

Ninfomaníaca, de Lars von Trier, explora a ninfomania e causou polêmica ao exibir cenas de sexo explícito e masoquismo, chegando a sofrer censuras e cortes em diversos países. O CINUSP reexibe o volume I, que integrou a primeira edição da mostra, e exibe pela primeira vez o volume II.

Também abordando a questão do sexo visto como vício, em Romance X, Catherine Breillat expõe as relações ambíguas e conturbadas de uma mulher com o sexo e com os homens, circulando o tempo todo entre o real e o imaginário e tocando em temas como dominação e machismo.

Dirigido e protagonizado por Chantal Akerman, o provocante Eu tu ele ela traz referências da representação sexual do cinema de Andy Warhol e ficou conhecido por uma cena de sexo em tempo real, que é uma marca autoral nos filmes da diretora. Já Tudo sobre Anna, de Jessica Nilsson, é um filme sobre relacionamentos carregado de sexo explícito e narrado sob a ótica da mulher.  

O obsceno não está somente nas telas, mas também nas páginas da literatura, nas gravuras e nas palavras que nos remetem ao sexo. A narração de um ato sexual pode excitar o ouvinte tanto quanto a apreciação visual. A Criada, de Park Chan-wook, trabalha com essa ideia e problematiza a imagem objetificada da mulher. O filme também trata da sedução e das relações de poder, tanto entre gêneros quanto entre classes sociais. O filme foi premiado em diversos festivais internacionais e foi exibido no Festival de Cannes de 2016.

Da literatura às telas, As Mil e Uma Noites, de Pier Paolo Pasolini, também integra a programação da mostra. O diretor adaptou para o cinema o formato das narrativas encaixadas, em que uma história está inserida em outra história e assim por diante. O filme mostra o sexo e os corpos nus com imagens ricas em cores vivas.

O intenso Love, de Gaspar Noé, traz a relação de um casal que experimenta o sexo com outras pessoas. O filme causou polêmica pela exibição de sexo explícito e ejaculação, envolvendo cenas de sexo a três, voyeurismo e sexo com uma menina de 17 anos, além de abuso de drogas.

Crônicas sexuais de uma família francesa, de Jean-Marc Barr e Pascal Arnold, parte da masturbação para refletir sobre as relações sexuais contemporâneas. Uma análise das cenas de sexo que são mostradas e das que são apenas verbalizadas permite notar alguns tabus ainda existentes.

A produção de filmes pornôs é tema de O Pornógrafo, de Bertrand Bonello, estrelado por Jean-Pierre Léaud. O que estimula e provoca o público? Um diretor de filmes pornográficos faz experimentações artísticas e reflexões que lançam dúvidas sobre os conceitos de obsceno e de pornográfico.

A prostituição como escolha, motivada pelo prazer sexual, está presente em Batalha no céu, de Carlos Reygadas. O sexo tem papel fundamental no encadeamento dos fatos e os corpos nus são retratados com delicadeza.

Exército dos Frutas, de Bruce LaBruce, aborda a ideia de subversão queer e revolução (política, sexual e, mais especificamente, homossexual - a “intifada gay”). O filme é carregado de humor e autocrítica, com referências históricas e políticas que vão desde os anos 60 - marcados por agitações políticas e pela revolução sexual - até os anos de mandato de Bush nos Estados Unidos.

Do mesmo diretor, o polêmico L.A. Zombie mostra o percurso sexual de um zumbi gay. Apesar de trazer o famoso astro pornô François Sagat, o filme foge dos estereótipos e apresenta uma proposta radical de representação do pornográfico no cinema. As fortes cenas alegóricas envolvendo sexo entre zumbis e grupos marginalizados levaram o filme a ser censurado em festivais internacionais como o de Melbourne, na Austrália.

O sexo como contestação da ordem aparece no nacional Nova Dubai, de Gustavo Vinagre. O ato sexual é quase sempre realizado ao ar livre e são expostos casos de incesto e pedofilia. O filme foi exibido em festivais internacionais como o de Roterdã, na Holanda, e o de Torino, na Itália.

No Brasil, o sexo explícito trilhou um longo caminho até começar a se mostrar nas telas, aparecendo pela primeira vez somente em 1982, com o longa-metragem Coisas Eróticas, de Raffaele Rossi e Laente Calicchio. O filme causou alvoroço ao ser exibido durante o regime militar. Essa história é contada em A Primeira Vez do Cinema Brasileiro, dirigido por Bruno Graziano, Denise Godinho e Hugo Moura. O documentário contém trechos originais e entrevistas com membros da equipe que produziu o filme.

O CINUSP exibe também um curta-metragem, Anêmona, de Felipe Santo. Partindo da relação entre a anêmona-do-mar e o peixe palhaço, sendo que este é o único que não é queimado pela anêmona, o filme fala da relação de um ex-casal e suas memórias.

 

Giulia Martini
Maria Carolina Gonçalves
Thiago Oliveira
Vitoria Freitas