VAMOS A LA PLAYA


Vamos a La Playa

de 5 a 23 de Dezembro

Como é o mar e a costa quando você os percebe? Pode ser um clarão de azul que acaba na areia branca. Pode ser uma água gélida que bate em pedregulhos.Podem passar sensações de turbulência ou de calmaria. 

Desde tempos imemoriais, o litoral nos causa grande admiração, espanto e interesse. Existe sempre algo que se procura ali, naquela imensidão de azul do céu e da água, no calor intenso, algo que faz o coração bater mais forte, algo que não se sabe o nome, que pode nos fazer sentir minúsculos perto da presença daquela força, mas também pode nos fazer sentir gigantes por ter força para enfrentá-la. 

Existe quem tem a sorte de nascer perto, mas também quem viaja muito para encontrar a costa. E geralmente quando se encontra com ela, a praia não é mais apenas um nome que se dá para um lugar, ela é uma experiência sensorial, física e emotiva que nos invade e nos toma por completo.

No clima ensolarado de dezembro, o Cinusp apresenta a mostra Vamos a La Playa, que acontece do dia 5 ao dia 23 de dezembro, que pretende retratar como o cinema captou a praia, tanto tecnicamente - ao desacostumar nosso olhar para ela e reformular nossa vista -, e também emotivamente, criando a sensação de estarmos, nem que seja por algumas horas, dentro dela em uma experiência completamente nova. Com uma coletânea de 17 filmes, sendo 3 deles dedicados a um tardão especial do diretor Eric Rohmer, o CINUSP espera trazer um gostinho do que é entrar na água, de sentir o sal e de se queimar ao sol para seus espectadores.

Ao começar a imaginar filmes que tenham como cenário a praia, não há quem não pense no clássico Tubarão, filme de suspense Steven Spielberg, lançado em 1975, e até hoje considerado uma das maiores bilheterias do cinema americano. Não foi por acaso: a tensão da invisibilidade do tubarão ao longo do filme, aliada à engenhosa câmera que reflete o olhar dele e à trilha sonora icônica de John Williams, criam uma das atmosferas praianas mais desesperadoras da história do cinema.

Mas não apenas tubarões que causam emoções intensas. Como diz o próprio nome, o filme Caçadores de emoção aborda uma história de violência na região costeira, onde um detetive terá de se infiltrar entre surfistas para desvendar um crime.

O surf aparece mais duas vezes em destaque: Tá dando onda é uma divertida jornada sobre o surf a partir de uma mistura um tanto absurda entre documentário, animação e pinguins, diferente do mais introspectivo O mar mais silencioso daquele verão que conta a história de um jovem deficiente auditivo na costa do Japão que encontra na prancha o seu sentido de vida.

Nessa toada um pouco mais melancólica, mas sem nunca perder de vista o cenário ensolarado, também serão exibidos Monika e o desejo de Ingmar Bergman, e Bonjour Tristesse, de Otto Preminger. Ambos retratam histórias de amor que se iniciam nesse cenário e temperaturas encantadoras, mas que vão aos poucos perdendo a beleza, tanto pelo tédio, quanto pelo vazio e a melancolia que tomam seus protagonistas ao reverem as consequências de suas rebeldias. 

Será exibido também o primeiro filme experimental autoral polonês, O último dia do verão, o longa de estréia de Tadeusz Konwicki que cria um desencontro amoroso entre dois personagens excêntricos, e desenvolve a questão da dor e da perda de maneira plena.

Não poderiam faltar referências no imaginário corrente das praias de veraneio os incontornáveis cenários tropicais. Propondo um salto temporal e espacial significativos,  Tabu de F.W. Murnau, filme mudo de 1931, conta como diz seu nome em inglês, uma história dos mares do sul do pacífico, na ilha de Bora-bora, onde dois jovens de uma tribo se apaixonam e não podem viver seu amor por conta das regras sociais do grupo em que vivem. Por conta de ser mudo, o filme cria uma experiência delicada de visão para seus espectadores, que podem se atentar a todos os detalhes das imagens que se passam na tela. Barravento, filme memorável de Glauber Rocha, traz também uma problemática social, entretanto, de maneira mais complexa e dramática ao ter como protagonista um jovem que sai de uma comunidade caiçara para estudar e retorna querendo mudar os valores culturais locais em prol dos ideais republicanos e humanistas que aprendeu fora. 

O filme Nos Embalos de Ipanema certamente já está presente no humor e entendimento brasileiro antes mesmo de ser visto pela primeira vez. Com o tom cômico e erótico típico de pornochanchadas brasileiras, o filme discute questões sobre classe utilizando os estereótipos clássicos de personas da vida urbana carioca, criando ao mesmo tempo uma situação de identificação pessoal e uma sátira sobre o trabalho naquela sociedade. Las Insoladas, filme argentino de Gustavo Taretto, traz essa questão também de maneira muito intensa, no desejo das personagens de fuga do trabalho, e por seu plot hilário e extremamente significativo para pensar as origens e os efeitos do imaginário a que elas estão expostas. 

A questão da fuga também está muito presente em outros filmes exibidos, mas em um tom um pouco mais jocoso.  Exposto mais explicitamente no O demônio das onze horas, e incluso na mostra também como uma homenagem ao diretor Jean Luc Godard, a fuga é retratada em uma jornada pela costa sul da França. Em meio a outdoors coloridos, símbolos da coca-cola e outros prenúncios da chegada do “imperialismo norte-americano”, um casal está em busca de um lugar seguro e  idílico que permita, justamente, que se desvencilhar de tudo que possa estar associado a sociedade de consumo. De outra maneira, um pouco mais desajeitadamente, tenta também Senhor Hulot, em As férias de senhor Hulot,  se desvencilhar de padrões hegemônicos de comportamento já que não é nada adaptado aos modos convencionais dos frequentadores dos balneários franceses, e gera muitas confusões em uma comédia singular.

As praias de Agnès revisita a costa francesa, que aparecerá muitas vezes nessa mostra, mas dessa vez a partir da cinebiografia de sua própria diretora, Agnès Varda. Enquanto ela percorre seu amor e fascínio por praias, interliga essas cenas com exposições, instalações e filmes que a marcaram. O espectador tem o privilégio de fazer um mergulho no oceano que foi a vida de Varda, e se impressionar com a sua beleza e riqueza formal e emotiva.

A mostra também contará com uma programação especial: a exibição de três filmes seguidos do diretor Eric Rohmer em uma tarde: Pauline na praia, A colecionadora e Conto de verão. Os três abordam o cotidiano de férias de verão de jovens franceses e capturam, nos cenários pedregulhosos e longas conversas, os amores,as dúvidas e os anseios desses jovens na praia: lugar que tanto promete quanto descumpre, que tanto assusta quanto alegra, que tanto revela quanto esconde, e assim cria uma representação bastante intensa sobre a vida, que só poderia ser captada, tão quente e profunda, com as lentes luminosas do cinema.         

Boas sessões!