PARA GOSTAR DE CINEMA
Existe algo de único no ato de assistir certos filmes numa sala de cinema. Algo que torna aquela sequência sucessiva de imagens em uma experiência capaz de transpor os espectadores para outros mundos e situações, marcando-os para o resto da vida. São experiências que nos movem e nos levam sempre de volta à sala de cinema. Entre os dias 20 de março e 08 de abril, o CINUSP apresenta, em mais uma edição, sua tradicional mostra Para Gostar de Cinema, com 14 filmes de diferentes gêneros, países e épocas, contando com clássicos do cinema mundial e alguns filmes que pouco circulam atualmente, criando assim uma ótima oportunidade para mantê-los vivos na sala de cinema.
Filmes de guerra sempre provocam reações fortes - sejam elas positivas ou não - mas Vá e Veja, de Elem Klimov, é estonteante. A Segunda Guerra Mundial é retratada sem medo de escancarar em sequências violentas e em cenas surreais os horrores provocados pelo exército nazista na URSS, sendo considerado um dos melhores filmes de guerra da história do cinema. Outro grande clássico, Um Corpo que Cai, de Alfred Hitchcock, continua a trajetória de seu diretor enquanto mestre do suspense com uma história cheia de reviravoltas, mantendo sempre uma aura de mistério. Além do uso inventivo da fotografia, inaugurando o conhecido efeito Vertigo, o filme foi eleito o melhor de toda história do cinema pela revista Sight and Sound em 2012.
Ainda no gênero do suspense, porém numa forma mais contemporânea, será exibido também Não! Não Olhe!, de Jordan Peele. O filme, recém saído das salas comerciais, trabalha com a expectativa do público numa mistura de ficção científica e terror, buscando a subversão de clichês e das próprias expectativas criadas. Outro terror que usa o suspense a seu favor é Possessão, de Andrzej Zulawski, contando a história de uma mulher que começa a agir de maneira estranha. A forma como a “loucura” da personagem escala junto com o filme rende cenas icônicas que, ao misturar terror e horror, com cenas gore, violentas e cheias de sangue, renderam ao filme um novo público hoje, por meio da internet.
Alguns outros filmes têm na violência de suas imagens e histórias aquilo que potencializa seus efeitos sobre o espectador. Fome Animal, de Peter Jackson, é um filme também de horror, considerado um dos mais sangrentos da história. Capaz de juntar as características de um filme de zumbi, com muito sangue e partes de corpos mutilados, a cenas engraçadas, assim evocando uma miríade de sensações - boas e ruins - em quem o assiste.
Já Amores Brutos, do mexicano Alejandro Iñárritu, tem em outra forma de violência sua face mais potente. Com uma narrativa tripartite, dois elementos unem as três histórias: cachorros e a violência da sociedade - ambos explorados em histórias quase absurdas de três personagens diferentes, com uma montagem acelerada e um ritmo frenético.
Os Bons Companheiros, de Martin Scorsese, clássico filme de máfia, trata o crime como estrelato. A violência tornada espetáculo e a fluidez da direção, que ironiza a própria glamourização em que opera, fazem do filme uma obra cativante. Com belíssimas cenas de lutas ma já fora da chave da violência, Herói, de Zhang Yimou, une a beleza e a grandeza da direção de arte e da fotografia e das coreografias, aliadas ao uso de múltiplos pontos de vista para contar uma história épica da China Imperial.
Ao tratar de questões sociais importantes, um filme pode ser também extasiante e despertar algo dentro de quem o assiste. Eles Não Usam Black-Tie, de Leon Hirszman, aborda o movimento sindical e as greves como forma de conquistar direitos trabalhistas. O filme incorpora o ódio e visceralidade da revolta, e os condensa em momentos de explosão contida. Outro longa que se beneficia da potência de uma problemática social é o senegalês Touki-Bouki, de Djibril Diop Mambéty. A história de dois amantes que tentam emigrar de Dakar para Paris explora as adversidades do caminho, o racismo e os resquícios coloniais da França. Com uma montagem que mescla as linhas temporais e experimentações estéticas, a angústia e os sonhos dos personagens são bem transpostos para o filme.
Mas nem só de grandes questões e batalhas vive o grande cinema. Certas vezes, o mero cotidiano, quando bem trabalhado, também pode ser cativante. É o caso de Jeanne Dielman, de Chantal Akerman, eleito melhor filme do mundo pela Sight and Sound em 2022. Uma sinfonia do dia-a-dia de uma viúva de 40 anos, metodicamente filmada e encenada. Em mais de três horas de filme, permite o espectador vaguear nas imagens e pensar sobre a simplicidade do ‘ser’ cotidiano ou o que se pode esconder dentro desse cotidiano aparentemente banal.
Outro filme que mergulha no aparente banal é Uma Mulher Sob Influência, de John Cassavetes, diretor famoso pelo seu método de trabalho com atores, em que a ênfase é dada à disrupção da dita normalidade. Ao acompanhar a “loucura” da protagonista, o filme se torna progressivamente mais angustiante, com planos aproximados e sequências de câmera na mão, em que vai ficando clara a urgência da personagem e de seus problemas. Junto com o longa também exibiremos o curta Canções de Avignon, de Jonas Mekas, outro expoente do cinema independente norte-americano. O diretor e o movimento são conhecidos por suas representações do cotidiano, e o curta em questão trata de uma viagem de Mekas a Avignon, com toda a sensibilidade e sutileza na montagem características do diretor.
O documentário Paris is Burning, de Jennie Livingston, traz para o cinema a cultura ballroom, com todo o brilho e irreverência dos artistas que são apresentados, sem perder de vista, porém, que se trata também de uma população marginalizada, como latinos, negros e LGBTs. Já o longa All That Jazz - O Show Deve Continuar, de Bob Fosse, trata do glamour do showbiz nos palcos da Broadway. Em um musical com tons autobiográficos, Fosse constrói um filme que narra a decadência de um homem, mas sem ser tomado pela melancolia. A inventividade de seus números musicais e a forma orgânica como eles se integram ao resto do filme são seus maiores atrativos.
E a mostra ainda terá duas surpresas: uma BATALHA DE ANIMAÇÃO em que competirão entre si são o clássico de animação stop motion A Fuga das Galinhas, de Peter Lord e Nick Park, e o famoso O Fim de Evangelion, de Hideaki Anno e Kazuya Tsurumaki, que reinventa o final da série de animação Evangelion, com sequências de animação experimentais e reflexões existenciais. O vencedor será decidido por votação popular no Instagram (@cinusp_) e a sessão com o vencedor ocorrerá no dia 31 de março, às 16h. A segunda surpresa será uma noite com a primeira edição do Quiz CINUSP, em que o público será desafiado a acertar questões acerca dos filmes da mostra - valendo o prémio de escolher um filme para uma sessão no CINUSP!
Clássicos que moldaram o fazer cinematográfico, histórias épicas de personalidades peculiares, experiências aterrorizantes ou imagens tão fantásticas que queimam em nossas retinas por anos a fio: o CINUSP convida todos para sentir tudo que o cinema pode causar, sentir emoções, das mais diversas, por meio da tela. Em Para Gostar de Cinema, oferecemos uma mostra diversa em um espaço público, para todos os públicos.
Boas sessões!